Tem humor que nasce pronto: café com leite, bolacha e dois políticos discutindo como se estivessem no recreio. Aí é engraçado. Aí funciona. Aí até o algoritmo olha e fala: “ok, isso eu entrego pra mais gente”. Mas tem humor que nasce torto, e torto fica, igual mindinho roxo de governador depois de uma cavalgada digna de filme do faroeste: o cavalo vai, o governador segue, a gravidade reclama, e o hospital agradece a visita.
Pois foi exatamente nesse cenário: “o Velho Oeste de Aracaju” que o deputado Thiago de Joaldo resolveu ativar seu modo stand-up de praça pública e brincar com a fratura do governador. Sim, fratura. Não é virose, não é unha encravada, não é calo, é osso quebrado, e logo o mindinho, o dedo do equilíbrio, o dedo do “opa, quase caí”, o dedo que ninguém respeita até virar protagonista.
O governador vai ao hospital, a filha médica confirma o diagnóstico, e no palácio o pessoal já se solta naquela resenha típica de quem tenta aliviar o clima. Entre risos, alguém comenta que o governador está “entregue ao Departamento Médico”, não só pelo mindinho, mas porque, depois do Botafogo deixar escapar o título de novo e os flamenguistas comemorarem como se fosse Carnaval fora de época, qualquer um precisaria de atenção especial. Humor interno, ambiente controlado, piada que diverte sem humilhar ninguém.
Mas eis que surge Thiago de Joaldo, afiado como faca de pão, para transformar a dor alheia em meme de baixa caloria. Aquele mesmo Thiago que dias antes protagonizou o embate épico da bolacha molhada no café com leite, esse, sim, um momento de ouro, patrimônio cultural imaterial do humor político sergipano. É esse Tiago que pensa: “Que tal agora brincar com a fratura do governador?” E o universo político responde: — Não, Thiago. Aquele humor era bom. Esse é apenas ruim.
Porque vamos combinar: brincar com comida é fofo, brincar com dor é feio. Brincar com café com leite é leve, brincar com um dedo quebrado é pesado. Brincar com bolacha é democrático, brincar com fratura é… desnecessário. E o público percebe. Sempre percebe. O eleitor até aceita ser enganado, mas não aceita piada sem graça.
Pra melhorar o combo, temos também o episódio do jornalista que perguntou da falta d’água, e o governador, no calor do momento, ofereceu um banheiro. Foi infeliz? Foi. Soou como “seja bem-vindo ao banho alheio”? Totalmente. Mas o governador fez aquilo que político raramente faz: voltou atrás, pediu desculpas e corrigiu.
Esse é o tipo de gesto sutil que separa o humorizador amador do gestor profissional: um tropeça, o outro levanta, passa gelo e segue governando mancando, mas governando. Thiago, por outro lado, parece ter estudado humor com aquele tio do churrasco que faz piada de velório e acha que é talento. É aquele momento em que você quer dizer: “Meu filho, humor tem limite, e você acabou de passar correndo por ele sem nem ver a placa.”
Porque, convenhamos: se fosse o inverso, se fosse o governador brincando da dor de Thiago, o deputado já estaria na tribuna pedindo CPI da Fisiologia do Humor, audiências públicas e uma sessão solene em homenagem ao mindinho machucado. No final das contas, o que sobra é simples: Dor não é entretenimento. Fratura não é meme. Mindinho não é pauta de TikTok.
O governador segue trabalhando, mesmo em modo canguru perneta, enquanto Thiago segue tentando fazer graça onde não tem. E isso, meus caros, é a verdadeira fratura exposta: a fratura do bom senso. Fica o recado: Humor pode até quebrar tabus, mas não precisa quebrar dedos no processo. E se for pra quebrar alguma coisa, que seja o gelo, não a dignidade alheia.




